Le Monde publica hoje uma reconstituiçao do discurso feito de improviso por Claude Lévi-Strauss por ocasiao de uma cerimônia no Collège de France comemorativa de seus 90 anos, em 25 de janeiro de 1999. O texto foi reconstituido de memoria por Roger-Pol Droit e aprovado pelo proprio Lévi-Strauss.
Trata-se de uma reflexao sobre a relaçao entre o homem e tempo nao se poderia pensar mais aguda. Voilà:
" Montaigne diz que a velhice nos diminui cada dia e vai nos consumindo de tal forma que, quando a morte sobrevém,nao leva mais que um quarto de homem ou um meio homem. Montaigne morreu com 59 anos e nao podia sem duvida ter idéia da extrema velhice na qual me encontro hoje. Nesta tao avançada idade que nunca pensei atingir e que constitui uma das mais curiosas surpresas de minha existência, tenho o sentimento de ser como um holograma partido. Esse holograma nao possui mais sua unidade completa e entretanto, como em todo holograma, cadaparte restante conserva uma imagem e uma representaçao completa do todo. Assim, hoje para mim ha um eu real, que nao é mais que um quarto ou a metade de um homem, e um eu virtual, que conserva ainda viva uma idéia do todo. O eu virtual concebe um projeto de livro, começa a organizar seus capitulos e diz ao eu real: "Cabe a você continuar". E o eu real, que nao pode mais, diz ao eu virtual: " Isso é problema seu. E so você que vê a totalidade."
Minha vida se desenvolve, atualmente, através desse dialogo muito estranho. Eu lhes sou muito reconhecido por ter por alguns instantes, graças a sua presença e a sua amizade, feito cessar esse dialogo, permitindo por um momento que esses dois eus coincidam de novo.
Sei bem que o eu real continua a fundir-se até sua dissoluçao ultima mas lhes sou grato por me terem estendido a mao, me dando assim, por um instante, o sentimento de que as coisas se passam diferentemente."
Dificil melhor sintese do efeito da passagem do tempo, da perspectiva da morte e do valor do amor, da amizade e, em ultima instância, da linguagem. Nao?
3 commentaires:
Nossa, eliana, que coisa absurdamente bela e verdadeira. Não li muito sobre a morte de Lévi Strauss, mas esse trecho que vc escolheu é uma maravilha de pensamento - sobre a vida, a morte, a velhice. Não há nada mais perfeito a dizer. Merci.
beijo,
clara
Clara querida,
Também fiquei muito impressionada com esse texto. A linguagem, no sentido amplo, vista, assim como o amor, se nao como salvaçao, ao menos como lenitivo.
Pois é.
Eliana
Eliana,maravilhoso esse texto do Levi Strauss, que você nós brindou
publicando no seu blog;obrigado!
Beijos,
Elias(doctor silvana)
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