Fashhadoo quer dizer "Testemunhem" em arabe e é a palavra-chave do hino nacional da Argélia.
Outro dia, meus filhos e eu estavamos ouvindo na internet hinos nacionais de varios paises e fomos como que capturados pela força do estribilho do hino argelino: "Fashhadoo! Fashhadoo! Fashhadoo!".
Fomos procurar a traduçao e encontramos uma letra fortissima. O testemunho que o estribilho pede refere-se à luta pela independência do pais.
Procuramos mais e ficamos sabendo que o texto foi escrito no contexto da guerra de libertaçao, foi cantado pela primeira vez em 1957 e que foi adotado como hino nacional depois da independência da Argélia, em 1963. O autor da letra, o poeta Moufdi Zakaria, escreveu-a em 1955 com seu sangue nas paredes da prisao em que estava preso em Argel. A musica - muito bela - é de Mohamed Fauzi.
A Argélia é um dos temas delicados - delicadissimos - aqui na França. A Argélia, a colonizaçao francesa, a descolonizaçao, a islamizaçao do pais, as dividas da França para com a naçao argelina, a integraçao dos argelinos residentes na França à naçao francesa, os harkis - Meu Deus, sao feridas que parecem mais dificeis de fechar que as provocadas pela Segunda Guerra entre a França e a Alemanha.
Para a grande populaçao de argelinos habitante da França assim como para os franceses descendentes de argelinos, a integraçao à sociedade francesa nao é so um desejo, é uma imperiosa necessidade. A França é - ainda e ainda bem - um pais que exige e promove a integraçao de seus habitantes a um nucleo de valores estabelecido como francês. Ela se nutre da diferença mas pondo-a a serviço da unidade nacional. Assim, desde a mais tenra infância, na esfera publica o francismo é inculcado nas crianças. E imagino como deve ser dificil para um menino filho ou neto de argelinos ter de estudar na escola o processo de colonizaçao e de descolonizaçao francesa na terra de seus ascendentes. Alias, ha pouco tempo desencadeou-se uma grande polêmica tendo por tema a necessidade ou a oportunidade de os livros didaticos apresentarem desculpas francesas aos povos colonizados no Maghreb, que é como se chama aqui o norte da Africa.
Como se antevisse esse processo, o hino da independência argelino, hino de luta - como a Marselhesa - é épico, narrativo: ele conta como começou a luta, seus motivos, suas fases, desde as trataçoes diplomaticas até a guerra. E tem como estribilho um unico voto, dirigido aos ouvintes: Nao esqueçam, nao deixem esquecer. Contem a seus filhos para que eles contem aos filhos deles. Testemunhem! Fashhadoo!
9 commentaires:
Vou até procurar o hino na web. É provável que o encontre.
Mas, quando você refere à Guerra Colonial francesa, lembro-me que fui testemunha de tantos acontecimentos. Temos que nos lembrar que à época assistíamos regularamente "Les Astualitées Françaises" no cinema.
Outrossim, esta Guerra Colonial, que originou o surgimento da OAS, de todos aqueles atentados s De Gaulle.
Um fator muito importante no povo francês é o questionamento. E ele gera todas essas dúvidas, todas essas buscas de explicação para o fatos tanto na Algeria quanto na Indochina...
Procure no Youtube, Jonga. Ha varios videos com letra e musica. Em arabe e em francês.
Todos muito bonitos.
Bises,
Eliana
Já ouvi. Toda marcha é impolgante. Mas não é por nada não, no meu entender, a "Marselhesa" ainda continua a ser o hino mais bonito, envolvente e, claro, de grande empolgação...
Nossa, que post lindo... eu comecei achando engraçado e já ia fazer uma gozação sobre você ser talvez a única pessoa que conheço que acessa a internet com os filhos, e ainda por cima para procurar hinos de outros países, não parece muito o nosso mundo atual.
Mas depois as coisas vão ficando densas e vc acaba trazendo uma questão importantíssima sobre liberdade, antigos rancores entre colonizados e colonizadores, feridas que jamais se curam, coisas, enfim, que importam, e muito...bom demaaaais, merci.
um abraço,
clara lopez
Clara, você realmente me estimula demais. Quando você diz " Lindo" eu acredito!
O hino argelino é comovente, estou até agora sob o impacto de sua letra e de sua musica também. Acho até que vou fazer um post com sua traduçao.
Quanto a acessar a interne com os filhos, querida, nao se esqueça de que aqui se vive mais dentro que fora de casa, adultos e jovens. Os paises do frio sao assim e aqui ja esta dando 1° grau ( é mole?).
Bises e mil mercis pela força.
Caramba, 1 grau é muito frio mesmo... a gente não tem noção das diferenças culturais que a temperatura promove, acho que eu não aguentaria, pelo menos quando começou a nevar lá naquele país, voltei rapidinho, achava insuportável.
Quanto ao hino, traduz mesmo, quero ler, e onde é que se ouve ele?
clara
Pronto, Clarita, ja pus o link. Amanha traduzo o texto. E da-lhe, Argélia!
Bises,
Eliana
Eliana, parabéns pelo texto muito bem escrito e relevante por ser um testemunho local. Interessante também notar a imparcialidade com que você tratou do assunto sem tender para colonizadores ou colonizados. Consciente e inteligente!
Mil mercis, Kovacs, pelo elogio e sobretudo pela leitura.
Quanto à imparcialidade, às vezes penso que para quem escreve ser imparcial é um desejo nem sempre realizado, um objetivo nem sempre atingido...
Abraços,
Eliana
Enregistrer un commentaire